segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

DE REPENTE 60... QUE FRIO NA BARRIGA QUE DÁ!




                                 Por Regina de Castro Pompeu


DE REPENTE 60 (ou 2x30)

Ao completar sessenta anos, lembrei do filme “De repente 30”, em que aadolescente, em seu aniversário, ansiosa por chegar logo à idade adulta,formula um desejo e se vê repentinamente com trinta anos, sem saber oque aconteceu nesse intervalo.


Meu sentimento é semelhante ao dela: perplexidade.
Pergunto a mim mesma: onde foram parar todos esses anos?
Ainda sou aquela menina assustada que entrou pela primeira vez na
escola, aquela filha desesperada pela perda precoce da mãe; ainda sou
aquela professorinha ingênua que enfrentou sua primeira turma, aquela
virgem sonhadora que entrou na igreja, vestida de branco, para um
casamento que durou tão pouco!Ainda sou aquela mãe aflita com a primeira
febre do filho que hoje tem mais de trinta anos.
Acho que é por isso que engordei, para caber tanta gente, é preciso
espaço!


Passei batido pela tal crise dos trinta, pois estava ocupada demais

lutando pela sobrevivência.
Os quarenta foram festejados com um baile, enquanto eu ansiava pela
aposentadoria na carreira do magistério, que aconteceu quatro anos
depois.


Os cinquenta me encontraram construindo uma nova vida, numa nova cidade,
num novo posto de trabalho.
Agora, aos sessenta, me pergunto onde está a velhinha que eu esperava
ser nesta idade e onde se escondeu a jovem que me olhava do espelho
todas as manhãs.


Tive o privilégio de viver uma época de p
rofundas e rápidas
transformações em todas as áreas: de Elvis Presley e Sinatra a Michael
Jackson, de Beatles e Rolling Stones a Madonna, de Chico e Caetano a
Cazuza e Ana Carolina; dos anos de chumbo da ditadura militar às
passeatas pelas diretas e empeachment do presidente a um novo país misto
de decepções e esperanças; da invenção da pílula e liberação sexual ao
bebê de proveta e o pesadelo da AIDS. 


Testemunhei a conquista dos cinco
títulos mundiais do futebol brasileiro (e alguns vexames históricos).
Nasci no ano em que a televisão chegou ao Brasil, mas minha família só
conseguiu comprar um aparelho usado dez anos depois e, por meio de suas
transmissões, vi a chegada do homem à lua, a queda do muro de Berlim e
algumas guerras modernas.


Passei por três reformas ortográficas e tive de

 aprender a nova
linguagem do computador e da internet. Aprendi tanto que foi por meio
desta que conheci, aos cinquenta e dois anos, meu companheiro, com quem
tenho, desde então, compartilhado as aventuras do viver.
Não me sinto diferente do que era há alguns anos, continuo tendo sonhos,
projetos, faço minhas caminhadas matinais com meu cachorro Kaká, pratico
ioga, me alimento e durmo bem (apesar das constantes visitas noturnas ao
banheiro), gosto de cinema, música, leio muito, viajo para os lugares
que um dia sonhei conhecer.


Por dois anos não exerci qualquer atividade profissional, mas voltei a
orientar trabalhos acadêmicos e a ministrar algumas disciplinas em
turmas de pós-graduação, o que me fez rejuvenescer em contato com os
alunos, que têm se beneficiado de minha experiência e com quem tenho
aprendido muito mais que ensinado.


Só agora comecei a precisar de óculos para perto (para longe eu uso há
muitos anos) e não tinjo os cabelos, pois os brancos são tão poucos que
nem se percebe (privilégio que herdei de meu pai, que só começou a ficar
grisalho após os setenta anos).


Há marcas do tempo, claro, e não somente rugas e os quilos a mais, mas
também cicatrizes, testemunhas de algumas aprendizagens: a do apêndice
me traz recordações do aniversário de nove anos passado no hospital; a
da cesárea marca minha iniciação como mãe e a mais recente, do câncer de
mama (felizmente curado), me lembra diariamente que a vida nos traz
surpresas nem sempre agradáveis e que não tenho tempo a perder.
A capacidade de fazer várias coisas ao mesmo tempo diminuiu, lembro de
coisas que aconteceram há mais de cinquenta anos e esqueço as panelas no
fogo.


Aliás, a memória (ou sua falta) m
erece um capítulo à parte:
constantemente procuro determinada palavra ou quero lembrar o nome de
alguém e começa a brincadeira de esconde-esconde. Tento fórmulas
nemônicas, recito o alfabeto mentalmente e nada! De repente, quando a
conversa já mudou de rumo ou o interlocutor já se foi, eis que surge o
nome ou palavra, como que zombando de mim...
Mas, do que é que eu estava falando mesmo?
Ah, sim, dos meus sessenta.


Claro que existem vantagens: pagar meia-
entrada (idosos, crianças e
estudantes têm essa prerrogativa, talvez porque não são considerados
pessoas inteiras), atendimento prioritário em filas exclusivas, sentar
sem culpa nos bancos reservados do metrô e a TPM passou a significar
“Tranquilidade Pós-Menopausa”.


Certamente o saldo é positivo, com muitas dúvidas e apenas uma certeza:

tenho mais passado que futuro e vivo o presente intensamente, em minha
nova condição de mulher muito sex...agenária! 



















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